
A
Didaquê (∆ιδαχń em grego clássico), ou
Instrução dos Doze
Apóstolos, é uma
obra do primeiro século.
É constituída apenas por
dezesseis pequenos capítulos,
mas, é de
grande relevância histórica e teológica. Considera-se originário da
Palestina ou da Síria, a data em que
foi escrita, divide os
estudiosos: uns colocam-na
antes da destruição
do templo (entre 60 a 70 D.C) e outros no período posterior (entre 70 e
90 DC.).
Quanto
à autoria, acredita-se que não terão sido os doze apóstolos a escrever diretamente
o texto, mas o nome terá sido dado por refletir os ensinamentos atribuídos aos
mesmos.
Existem
muitas menções de trechos da Didaquê em escritos da igreja antiga atestando
assim a sua importância. Ela deve ter gozado de ampla circulação por algum
tempo, sendo aceita pelo menos por uma parte da igreja como um livro digno de
ser lido no culto divino. Por exemplo, Clemente de Alexandria a cita uma vez
como Escritura.
A
Didaquê pode ser dividida em duas partes :
A primeira: Os
dois caminhos (1-6): Traz um código de moralidade cristã, apresentando as
diferentes virtudes e vícios que constituem, respectivamente, o Caminho da Vida
e o Caminho da Morte.
A segunda:
Manual eclesiástico (7-16): É compêndio de regras que tratam de diversos
aspectos da vida da igreja, tais como: batismo, jejum, eucaristia, missionários
itinerantes, ministros locais, entre outros.
É
exatamente na segunda parte, que foram consignadas orientações importantes a
respeito dos aproveitadores da fé alheia, que porventura visitassem alguma
comunidade eclesiástica. Estes aproveitadores, falsos mestres e profetas, eram
identificados a partir da caracterização de suas ações e de seus ensinamentos.
Embora
seja um documento do primeiro século, e mesmo correndo o risco de cometer um
anacronismo, gostaria de aplicar algumas de suas orientações à igreja
contemporânea.
Os
mestres eram avaliados a partir da doutrina que pregavam, os seus ensinamentos
deviam passar no clivo da ortodoxia,
caso fossem reprovados, tanto a sua mensagem como a sua pessoa deviam ser
sumariamente rejeitados:
•
1 - Se, portanto, alguém chegar a vós
com instruções conformes com tudo aquilo que acima é dito, recebei-o.
•
2 - Mas, se aquele que ensina é perverso
e expõe outras doutrinas para demolir, não lhe deis atenção; se, porém, ensina
para aumentar a justiça e o conhecimento do Senhor, recebei-o como o Senhor.
Imagine
o que seria dos pregadores de novidades teológicas espúrias, caso a igreja
contemporânea observasse este item; ou mesmo do nínel da audiência dos
programas televisivos evangélicos que despejam toneladas de lixo teológico nas
salas de muitos cristãos desavisados, seria um santo remédio para a fragilidade
doutrinária vivenciada pela igreja desta geração.
Os
mensageiros eram avaliados também a partir de sua honestidade com o bem alheio,
era observado se as solicitações visavam suprir as suas necessidades, ou simplesmente almejavam
explorar a igreja, as suas ações deviam passar no clivo da ganância:
•
4 - Todo o apóstolo que vem a vós seja
recebido como o Senhor.
•
5 - Mas ele não deverá ficar mais que
um dia, ou, se necessário, mais outro. Se ele, porém, permanecer três dias é um
falso profeta.
•
6 - Na sua partida, o apóstolo não
leve nada, a não ser o pão necessário até a seguinte estação; se, porém, pedir
dinheiro é falso profeta.
•
12 - O que disser, sob inspiração:
dá-me dinheiro, ou qualquer outra coisa, não o escuteis; se, porém, pedir para
outros necessitados, então ninguém o julgue.
Imagine
se a igreja contemporânea observasse as orientações da Didaquê, o que seria dos
cantores e pregadores, estrelas do show
business gospel, que cobram seus pesos em ouro para cantarem, pregarem ou
testemunharem, requerem os melhores hotéis, tratamento vip, e esbanjam em seus
deleites o dinheiro dos incautos. E como seria recepcionadas pela comunidade
aquelas ditas ou malditas “revelações”, que afirmam que os membros da igreja
devem meter a mão do bolso e depositarem o seu suado dinheirinho para serem
abençoados. Observar tais orientações da Didaquê funcionaria como um remédio
para a ganância e exploração alheia do rebanho do Senhor.
Além
dos parâmetros já citados, a Didaquê orientava a igreja a observar a vida do
pregador, ou seja, se o mesmo vivia o que pregava. As suas ações deviam passar
no clivo da coerência:
8
- Nem todo aquele que fala no espírito é profeta, a não ser aquele que vive
como o Senhor. Na conduta de vida conhecereis, pois, o falso profeta e o
(verdadeiro) profeta.
10
- Todo profeta que ensina a verdade sem praticá-la é falso profeta.
Imagine o que seria dos pregadores que
conduzem a sua vida de forma desordenada, que se acham acima do bem e do mal,
que a Lei do Senhor está simplesmente em suas bocas, contudo, não são
refletidas em sua conduta. A observância da Didaquê ajudaria a sarar a
frouxidão moral e incoerência testemunhal da igreja contemporânea.
Concluo esta reflexão, alertando para o fato que
em nenhum momento estou querendo lançar sobre a Didaquê a autoridade de regra
de fé e prática que só cabe a Bíblia
Sagrada. Contudo, almejo promover uma reflexão a respeito das preocupações e
inquietações da igreja primitiva, preocupações estas, que foram abandonadas
pela igreja contemporânea, que de tão moderna, esquece que a matéria prima da
igreja enquanto instituição que atua neste mundo, ainda é o velho homem caído
desde o Éden, e por isso, como bem ensinou os primeiros lideres da igreja, é
importante observar a vida e ensinamentos de seus pretensos mestres,
sujeitando-os aos clivos: da ortodoxia,
da ganância e da coerência.
Pr.
Jonas Silva.

Muito boa reflexão sobre a aplicabilidade atual da Didaquê e seus critérios neotestamentários para discernir os ensinos dos mercantes da fé!